05/08/2006

Os valores do Jumento

Reza assim O Jumento (com comentários intercalados meus):
A guerra lançada por Israel contra o Hezbollah, bem como contra todos os libaneses não identificados ou que não obedeçam à mais pequena ordem do Tsahal ...
No Líbano, como em qualquer outro local, é inimigo quem se afastar, minimamente das posições do Hezbollah. No Líbano, como noutro local qualquer, é inimigo a abater quem não estiver com o Hezbollah.

Transformando o Líbano num paiol, o Hesbollad ataca dois inimigos: Israel, como se sabe, e aqueles que tiveram a lata de expulsar os Sírios: os libaneses – o inimigo principal do Hezbollah (nesta caso).

Esta forma de estar no planeta Terra, tem ainda outra vantagem: coloca Israel perante o dilema de acabar por provocar inúmeras vítimas entre aqueles que se afastaram das posições da Síria e do Hezbollah.

Para o Hezbollah, é alvo a abater (“com a ajuda de Alá”) todo e qualquer que se afaste das suas posições.
....saldou-se até ao momento por uma estrondosa derrota.

Uma derrota porque acabou a imagem de invencibilidade do Tsahal, porque a Mossad revelou-se ineficaz, porque as forças armadas de Israel têm evidenciado um desrespeito pela condição humana que no Ocidente e desde a Guerra Mundial só tínhamos assistido na Bósnia e porque Israel conseguiu transformar aquilo a que chamava um movimento terrorista na resistência do Líbano e unir a maioria dos libaneses no apoio ao Hezbollah.
Para o Hesbollad, quanto mais libaneses morrerem maior será aquilo que eles pensam ser a sua vitória. Não é assim para a generalidade do resto do mundo ocidental, cuja condição o Jumento diz defender, mas é assim para eles, e também para o Jumento. E quem, no terreno ousa dizer que não está com o Hezbollah?

Quanto à reclamada incapacidade do Tsahal, quem diria que a acção era desproporcionada! Há uma semana era um dado aquirido.
Defender que teve autorização internacional para a guerra, que por aquilo que temos visto significa autorização para matar, é puro cinismo ...
Cinismo é pretender que a guerra não implique autorização para matar. Esse problema não se põe para o Jumento, em relação ao Hezbollah.
... como também o foi dizer que o posto de observação da ONU foi atingido por engano ao mesmo tempo que o governo israelita tudo faz para fazer de conta que a ONU não existe.
A ONU, como vai na cabeça do Jumento, não existe, muito embora esteja a fazer um esforço tremendo para existir. Nos ataques de Israel cometem-se enganos, porque são a excepção. Nos ataques do Hezbollah não há engano: por um lado a ONU é uma ferramenta de guerra, por outro, a meta é matar, matar, matar. Quanto mais se matar mais virgens se alcançam.
E tudo serve na sua estratégia de terror, desde matar militares da ONU a destruir edifícios civis em série com o argumento da utilização por terroristas, o que nos levaria a concluir que o Hezbollah tem mais bases do que as formas armadas dos EUA.
E os rockets surgem de onde? Onde há rocket há uma posição militar. Que queria o Jumento? Que os israelitas fizessem saltar, de para-quedas, uma assistentes sociais em cada posto de artilharia do Hezbollah, para convencer os “civis” que manuseiam cada lança-rocket a deslocarem-se para zonas não habitadas?
O que Israel pretendia era lançar uma guerra em grande escala no Médio Oriente agora que se sente fortalecido militarmente e que conta com o apoio incondicional com um governo americano que é do pior que este país poderia ter, ...
O que irrita o Jumento é que Israel conta agora, também, com o apoio tácito da Comunidade Europeia, que já não consegue esconder que (finalmente) percebeu que a guerra do Hezbollah é uma guerra contra o modo de vida ocidental (que o jumento diz defender).
... muito embora agora quase deseje a vinda de uma força internacional para proteger uma fronteira que nunca o será enquanto Israel optar por resolver os problemas recorrendo à lei da bala.
Essa é uma das grandes vitórias de Israel.

A Europa, já incapaz de condenar liminarmente (como no passado) a acção de Israel, escudou-se inicialmente no disparate da desproporcionalidade do ataque israelita. Israel aproveitou a brecha que a política europeia abriu (a desproporcionalidade – Israel lutando contra forças fracas) para concordar com o envio de tropas internacionais. Entretanto a Europa foi percebendo que aquilo é uma guerra a sério (pouco “desproporcional”) procura agora milhentas formas para escapar ao destino a que a sua precipitada reacção lhe reservava: guerrear o Hezbollah.

Os Israelitas dizem que apoiam a força, mas já sabem que, na melhor hipótese, ela só se posicionará no terreno depois de Israel fazer o trabalho difícil. Qual o país europeu, “multilateralista” capaz de suportar baixas próprias?

E convém lembrar que a história recente tem demonstrado que, quando as coisas aquecem, a ONU é a primeira a dar à sola. Não o fez presentemente no caso do Líbano, mas devia ter feito, porque é isso que faz melhor. A coisa aqueceu no Afeganistão, e a Nato (grosso modo os EUA) tomou o comando.
Sempre fui defensor da existência do estado de Israel, mas neste momento tenho que dizer que acima de um estado de Israel estão os meus valores civilizacionais, entre o estado de Israel e a defesa de valores como o do direito à vida não terei quaisquer dúvidas em optar.
Já se esperava ao que conduziriam esses “valores” civilizacionais do Jumento: Israel não tem direito à vida.
É esta escolha que Israel me está obrigando a fazer, entre a barbárie como solução para serem alcançados os objectivos de um país e os valores dados como adquiridos no Ocidente. O facto de Israel ser vítima do terrorismo não significa que não o avaliemos segundo os mesmos padrões civilizacionais que nos levam a condenar o terrorismo.
Este último parágrafo espelha perfeitamente todo o anterior aberrante e absurdo discurso do Jumento.

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