07/03/2007

Da má-fé

Por me parecer digna de reflexão, transcrevo esta resposta do Lidador, a um comentário meu.

Caro Range-o-Dente, o conceito de Sartre aplica-se a alguém que acredita ser aquilo que não é.

Há uma crença, a pessoa é genuína.
Tem fé.

O conceito que o Range o Dente refere, não radica na crença.

Pode ser hipocrisia, cinismo ou então, já no campo da psicologia, mera dissonância cognitiva, isto é, a pessoa recusa tomar conhecimento de algo que contraria as suas íntimas convicções, ou pulsões.

A hipocrisia e o cinismo são racionais, a pessoa sabe que o está a ser.

A má-fé e a ignorância cognitiva não são racionais.

Por exemplo, têm aparecido aqui comentadores que sendo objectivamente anti-semitas, uma vez que verbalizam o ódio, justificam-no, relativizam as posturas de Hitler, etc, não se assumem como tal, porque não acreditam que o são.

É má-fé. São facticamente aquilo que não acreditam ser, transcendentalmente.

E é evidente que este desfasamento entre o ser e o crer, introduz uma perturbação na racionalidade que é resolvida racionalizando o ódio.

O indivíduo já não odeia porque é racista, mas porque o objecto do ódio o obriga a odiar.

É como uma mulher que põe os palitos ao marido. De um modo geral não diz que o faz porque queria variar ou porque lhe apeteceu, mas sim porque ele, o marido, a "obrigou" a isso, pelo seu desinteresse ou atitude.

A culpa não é dela, é do marido. Ela, que facticamente se enrolou com outro gajo, é, transcendentalmente a vítima, e a vítima passa a culpado.
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