Na entrada anterior, disse que gostávamos de ter opiniões antes de informações. Uma vez formada a opinião, toda a informação é lida a essa luz. É particularmente triste que os nossos jornalistas e opinion makers assim o sejam também..
O Sargento e esposa receberam de uma desconhecida, em situação ilegal, uma menina com 3 meses de idade (anexada vinha uma doação notarial). Questionamos a seriedade do casal que fez isto? Questionamos a seriedade de quem adopta uma criança desta forma? Analisamos sequer as consequências (tráfico de crianças) de se generalizarem tais processos? Não, não e não. A todas as perguntas a resposta é só uma: o Sargento é um Pai com P grande.
Confrontado com o nascimento, Baltazar não acredita que a filha seja sua. É normal que alguém que teve uma relação ocasional com uma imigrante ilegal brasileira (que já reconheceu que em tempos se prostituiu) tenha bons motivos para duvidar da paternidade? Não, claro que não. O Baltazar teve dúvidas… é um patife.
O Baltazar disse, desde o início, que se os testes de paternidade o confirmassem, que educaria a sua filha. Elogiamos a sua hombridade? Destacamos a sua vontade de assumir as suas responsabilidades? Não! Acusamo-lo de fazer depender a paternidade de um teste. Indignamo-nos, é perfeitamente comum os homens perfilharem filhos que não sabem se são seus. Aliás, sempre que uma prostituta engravida todos os clientes fazem bicha exigindo a paternidade da criança.
Passam uns inusitados 7 meses desde que Baltazar se disponibiliza para os testes até que os resultados são conhecidos. Podíamos, claro, criticar o Sargento e a esposa por não terem apressado os testes. Afinal, depois da forma como receberam a criança, com uma declaração notarial assinada por uma mulher que não conheciam de lado nenhum, deviam estar ansiosos por regularizar a situação. Mas não, criticamos o Baltazar por não ter apressado os testes. Ficamos indignados por não ter recorrido ao IPATIMUP. Será sequer crível que Baltazar, carpinteiro de profissão, nunca tenha ouvido falar no IPATIMUP? Será admissível que Baltazar tenha confiado nos tribunais e presumido que o processo estava a decorrer com a celeridade normal? Não, claro que não, é um patife que não quer saber da filha para nada.
O Sargento e a esposa têm a Esmeralda há um mês quando sabem que o provável pai quererá a filha. Sete meses depois, ainda Esmeralda não tem um ano de idade, confirma-se. Dada a forma absoluta e obviamente ilegal como receberam uma criança, prontificam-se a entregá-la ao pai? Não. Afinal de contas são uns Pais maravilhosos.
Estivesse eu na pele do Baltazar e contrataria uns marmanjos para assaltar a casa do Sargento e recuperar a filha. Tivesse ele feito isso e teria todos os jornais, jornalistas e opinion makers a seu lado. Mas não, como não disparatou, como não se pôs aos tiros, como (provavelmente) acreditou no sistema judicial, esperou por uma decisão de um Juiz. É um patife, portanto, se fosse um bom pai teria sido pró-activo, em vez de se sentar passivamente à espera de uma decisão do tribunal.
Decisão que chegaria, tinha Esmeralda 2 anos. O Juiz deu-lhe razão. E o Sargento, como bom Pai que é, Pai afectivo e do coração, recusou-se a entregá-la. Não deixa a Esmeralda ver o pai. Não se sabe o seu paradeiro. Não se sabe como será em Setembro quando começar a Escola Primária. Esconde a Esmeralda há três anos. Ninguém se indigna com o Sargento. Afinal, Pai é quem cria (nem que para isso tenha de roubar uma criança com poucos meses de idade). Quem, como o Baltazar, actua sempre dentro da legalidade, sempre recorrendo às instâncias competentes, não merece a filha que fez.
Qualquer facto relatado é interpretado à luz das primeiras impressões: o Sargento é um Pai extremoso e protector, o Baltazar abandonou a filha. Penso que foi a Mafaldinha que afirmou que metade do que os jornais dizem é falso e que metade do que devem dizer não dizem pelo que, na verdade, nem sequer existem. É pena.
28/01/2007
Demasiada falta de dúvidas
[Transcrevo, na totalidade, esta excelente posta de A Destreza das Dúvidas].