08/09/2007

Há professores a mais e inteligência a menos

Acicatado pelo António (chapelada), aqui fica mais uma autópsia.
Quando a ministra da Educação diz que a oferta de professores é maior do que a procura tem razão, mas a forma como aborda este problema é menos própria e revela uma falta de consideração pelos professores que é inaceitável num responsável pela educação. A ministra fala dos professores como se fosse o encarregado de uma obra pública a dizer aos serventes de pedreiro que procurem outra obra, porque para a semana já não há trabalho.
Este parágrafo resume bem o filme O Triunfo dos Porcos. Somos todos iguais, mas uns são mais iguais que os outros. O ajudante de pedreiro pode ser despedido, ser enviado às urtigas, passar fome, que, não pertencendo à casta dos professores, nada poderá, por alí, ser apontado como inaceitável.
É evidente que o número de alunos e mesmo de escolas diminui, que as funções não educativas das escolas, como é o caso da sua gestão, tenderá a não ser desempenhadas por professores. É também evidente que a melhoria do ensino pode colidir com hábitos e mesmo direitos concedidos no passado.
“Direitos concedidos no passado” ... resvalando, implicitamente para direitos inalienáveis. “Pode colidir” ... mas a força que “põe em causa” não deve prevalecer ...
Mas isso não implica que se crie na sociedade a ideia de que os professores são uns malandros, sem professores prestigiados e socialmente considerados nenhuma reforma do ensino será bem sucedida.
Pois não implica, a não ser que o prestígio seja abalado por posições de defesa de casta, claramente o caso presente.
Só que não se entende que o primeiro-ministro ande com o porta-bagagens do carro cheio de portáteis para distribuir pelos bem sucedidos das Novas Oportunidades e que a ministra da Educação revele tanto desprezo por milhares de professores que são vítimas da redução do número de vagas no ensino. Que se saiba foi o Estado que criou os cursos, que estimulou a formação de professores, ninguém chegou a professor com um curso de fachada pago com dinheiros do Fundo Social Europeu.
... o Estado criou e os tais de “professores”, pertensamente gente com algo entre as orelhas, que se comporta como as ratazanas: morde o isco. Fica-se a saber que o “professor”, cujo percurso formativo foi isento de processos de fachada, chegou ao fim da ladeira sem perceber que estava a ser “vítima” de um isco, como se nunca o tivesse alimentado a coisa conscientemente. Perdão, antes de ferrar o dente, a ratazana é mais cautelosa.
O mínimo que se esperava era que a ministra e o próprio primeiro-ministro abordassem este problema com alguma preocupação, com a mesma preocupação que por vezes se assiste quando fecha uma fábrica. Não basta dizer-lhes para irem ao centro de emprego mais próximo onde ainda por cima estão a ser maltratados. Ao terem optado por ser professores alguns destes profissionais dedicaram os melhores anos da sua vida à preparação, optaram por aquela que consideraram ser a sua vocação, desprezaram outras oportunidades profissionais.
... e não se percebe que a merda que tem saído das organizações sindicais dos professores resultou no facto de já ninguém ter pachorra para aturar reivindicações de casta? Reclamam-se agora os poucos direitos de quem, sempre tendo aguentado sem estrebuchar, se encontra numa encruzilhada difícil. Serão os “professores” os únicos legítimos detentores do direito a estrebuchar?

Se o prestígio não se reivindica, conquista-se, muito menos se renega tomando posições desprestigiantes, e querendo, em simultâneo, manter o prestígio via reivindicação classista.
O que teria sucedido ao sistema de ensino se há dez ou quinze anos os jovens não tivessem optado pela carreira de professor prevendo que estes seriam excedentários? Agora estaríamos a contratar professores brasileiros ou mesmo galegos, foi isso que sucedeu com os profissionais da saúde onde o numerus clausus criou uma situação simétrica à do ensino, onde a oferta de profissionais é menor do que a procura. O Estado poderia e deveria ter previsto esta situação mas por incompetência, cinismo ou mesmo oportunismo das universidades nada fez, milhares de jovens deram o melhor nos seus estudos para agora estarem num beco sem saída.
Depreende-se que à data “em que os jovens” optaram pela carreira de professor, não houvesse organizações sindicais compostas por adultos. Coitados. Todos jovens, embarcaram numa trapaça de governantes. Aborrecem-se agora perante o sucesso de outra casta, a dos médicos que, em devido tempo, trataram de “garantir” o seu futuro fazendo exactamente o contrário daquilo que fizeram os professores.

Parece até que os médicos tiveram sucesso à custa dos professores.

... tse, tse, tse.

O estado poderia ter previsto tudo e mais alguma coisa, os jovens ficaram em segundo lugar no acesso à inteligência obtida pelas ratazanas.

... e depois saíram ... “educadores”.
A ministra da Educação deveria compreender que há uma grande diferença entre uma responsável pela educação e um qualquer encarregado responsável por contratar serventes para uma obra pública. Deveria compreender mas pelos vistos não compreende ou a sua má formação leva-a a pensar que quanto pior tratar os professores mais fará passar a ideia de que é a grande reformadora do ensino. Reduzir o problema da redução dos alunos a uma consequência da natalidade é oportunismo, a ministra sabe (ou será que sabe mesmo?) que um dos problemas do ensino em Portugal é a reduzida escolaridade dos portugueses.
Serventes e professores não são, de facto, a mesma coisa. Se os professores se comportassem como serventes já seria um passo em frente. Um dos problemas do ensino em Portugal reside na reduzida inteligência demonstrada pelo comportamento dos professores. O normal seria usarem da inteligência que, descobrem agora, os ajudantes de pedreiro também têm.
Se é verdade que a tendência é para que haja menos alunos, daí podendo resultar um excedente de professores, também é verdade que a ministra deveria questionar-se porque há professores a menos, não fazendo passar a ideia de que tudo resulta do défice de libido dos portugueses. A verdade é que ao mesmo tempo que a ministra explica que há menos crianças os dados do Eurostat a percentagem de jovens que saíram precocemente da escola e cujo nível de estudos não ultrapassa o 9º ano de escolaridade subiu de 38,6%, em 2005, para 39,2%. Isto é, uma parte dos professores que ficou no desemprego foi vítima da incapacidade de a ministra para adoptar políticas que reduzam o abandono escolar. Esta taxa vergonhosa é mais do dobro da média europeia.
A ministra nunca poderá questionar-se porque haverá professores a menos no exacto momento em que há professores a mais. A matemática invocada fundamente o primeiro lugar obtido pelas ratazanas. Fica-se a “saber” que os portugueses fornicam QB mas que os rebentos abandonam a escola. Tá bem.

Pretende-se agora sacudir a água do capote e escamotear que os professores venderam a sua dignidade a proventos salariais relativos face a amanhãs-que-cantam que redundaram numa taxa de “sucesso escolar” miserável cuja qualidade nem vale a pena abordar: coisas do mundo do eduquês.

Não é por acaso que se lhe chama “sucesso escolar” e não sucesso educativo: mais uma sacudidela de capote.
Em vez de dissertar sobre as curvas da oferta e da procura do mercado de trabalho dos professores a ministra deveria explicar porque motivo o Governo foi incapaz de cumprir comas metas que estabeleceu para o abandono escolar (30% até 2008 e para 25% até 2010) e para a percentagem de jovens com o ensino secundário (65% até 2010). A verdade é que muitos dos que pensaram poder continuar a ser professores acreditando nas metas do governo estão agora no desemprego a ouvir a ministra dizer-lhes que a culpa foi do aumento do consumo de preservativos há dez anos atrás.
... o professor como espantalho. Nada tem a ver como ele, a não ser no caso de nem conseguir ser, de facto, professor.
Todavia, é um facto que a inversão das tendências da natalidade e a contínua formação de professores resulta-se num desajustamento entre a oferta e a procura de docentes e que mesmo que se adoptem algumas medidas paliativas e se combata o abandono escolar o problema persista. É necessário abordar o problema com uma sensibilidade que a ministra, mais empenhada em resolver o défice público do que os problemas do ensino, não evidenciou.
... como se não se tivesse mantido a engrenagem bem oleada e bem alimentada na expectativa de continuar a aumentar o número de “professores” pela via da redução do número de alunos por turma. Como se a generalidade dos professores não tivesse alinhado na aceitação de matéria aberrante, de “paradigmas” aparvalhados e não tivesse alinhado na transformação do aluno indisciplinado em aluno “hiper-activo”.
Se a ministra quer fazer uma abordagem primária do mercado de trabalho dos professores afirmando que há um excesso da procura, então também terá que concluir que há um défice na procura pela qual ela própria é responsável. Temos, portanto, professores a mais e ministra a menos.
Palermices como esta, “gira”, apenas afundam ainda mais o residual prestígio dos professores face ao mundo real, no qual os professores “se vêm”, agora, forçados a viver!

Coisas que acontecem quando os iguais apoiam implicitamente a retirada de tapete, de que padecem os mais iguais.

... não tendo aprendido a bem, terão que aprender a mal. ... coisas que a “educação” deles bem podia ter evitado, não fosse dado o caso de ter sido, desde há 20 anos, capitaneada por “cientistas em educação”.

... engenhêros.

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