06/12/2005

O analgésico Mário Soares

Declara Mário Soares, a 5 de Maio de 2005, à revista Visão:

Mário Soares diagnostica bem, mas resolve mal.
... não houve reciclagem oportuna das nossas empresas.
Quando uma empresa não se recicla, é suposto ir às urtigas. Em Portugal, demora muito tempo. A morte de uma empresa é um processo tão tortuoso que arrasta para o calvário todos o que a ela estiverem ligados. Se ela morresse mais facilmente, quem nela trabalhasse poderia fazer-se à vida ainda num estado psicológico aceitável e sem numa situação financeira não catastrófica. Por via da ‘morte lenta’ já só o faz em desespero de causa.

Quanto às formas de o evitar, naturalmente por via da reciclagem, há que contar com dois componentes: maquinaria e pessoal. O problema da maquinaria resolve-se com investimento, como aliás o da reciclagem do pessoal. O problema é que a maquinaria, sendo adquirida, não se nega a funcionar. A reciclagem do pessoal pode resultar ou não, arrastando consigo a eficácia e eficiência da maquinaria (eficácia é difícil de conseguir, eficiência ainda mais).

A formação em Portugal, tem fracos resultados numa inquietante percentagem dos casos porque os formandos não estão de facto convencidos que ela é fulcral para o seu futuro. Vêm nela uma espécie de praxe. Algo que lhes dará um canudo que valerá por si próprio, desligado das matérias que, devidamente assimiladas, não podem ser ‘para esquecer’.

Perante este cenário, Mário Soares remete as responsabilidades do processo para as tais medidas que o governo não terá tomado. Sempre o governo, tutor de tudo e todos. O governo e o estado como um deus todo poderoso, omnipresente e omnipotente. O velho problema de encarar o estado como um substituinte
das religiões tradicionais. Nem passa, aparentemente, pela cabeça de Mário Soares que a melhor forma de resolver o problema é tirar o estado do caminho das empresas, para que elas não passem a vida a tropeçar nele.
... em virtude dos baixos salários [na China] ...
Quanto ao problema da China, Mário Soares compreende o problema mas foge-lhe. Que fazer? Impor taxas alfandegárias à entrada de produtos chineses para colmatar a concorrência desleal face à falta de garantias sociais chinesas? Não pode ser porque, por um lado, Mário Soares poderia ser acusado de pretender boicotar o desenvolvimento do terceiro mundo. Por outro, porque Mário Soares sabe que a China só importa tecnologia europeia caso a Europa lhes abra as alfândegas. Ontem, aliás, foi noticiada a compra, pela China, de 150 aviões Airbus. Essa tecnologia, sendo maioritariamente europeia, não é portuguesa.

Alternativamente, Mário Soares podia chamar a atenção que, face ao que chegámos (falta de competitividade) não nos resta outra coisa que concorrer com os salários dos chineses até que consigamos competir com a sua produtividade. Mas Mário Soares não o faz ... remete o assunto para um culpado - o estado - por interposto governo, como se o dito não fossemos todos nós.

Mário Soares coloca-se, portanto, na posição de dinamizador de uma lógica retorcida em que todos somos sistematicamente torpedeados pelo estado, que somos nós próprios. Enfim, aquilo a que se chama um tiro nos pés.

Mário Soares, paladino de uma esquerda ‘moderna’!! coloca-se mais uma vez, na posição de entorpecente cerebral. Opinando nos moldes em que o faz camufla o problema contribuindo para o seu agravamento.

Com uma esquerda destas a defender os interesses do povo, quem sobra para os defender?

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